O presente texto tem o intuito de pesquisar o efeito processual do termo de acordo realizado na mediação extrajudicial. Assim, será verificado breve apontamento sobre mediação e as diferenças entre as modalidades judicial e extrajudicial. Em seguida, a concepção do termo de acordo e, por fim, o efeito processual do acordo realizado na mediação extrajudicial.
De um modo geral entende-se que a mediação é a possibilidade de uma terceira pessoa intervir em uma questão que pode ser negocial de âmbito empresarial ou de um conflito específico entre pessoas físicas, a qual é apresentada pelas partes envolvidas, sendo que esse terceiro tem o papel de facilitar um acordo.
Nesse sentido, explica Christopher W. Moore que:
a mediação é geralmente definida como a interferência em uma negociação ou em um conflito de uma terceira parte aceitável, tendo um poder de decisão limitado ou não-autoritário, e que ajuda as partes envolvidas a chegarem voluntariamente a um acordo, mutuamente aceitável com relação as questões em disputa. [1]
Na doutrina pátria processual Freddie Didier Jr define mediação da seguinte forma:
em que um terceiro intervém em um processo negocial, com a função de auxiliar as partes achegar à autocomposição. Ao terceiro não cabe resolver o problema, como acontece na arbitragem o mediador/conciliador exerce um papel de catalisador da solução negociai do conflito. Não são, por isso, espécies de heterocomposição do conflito; trata- se de exemplos de autocomposição, com a participação de um terceiro.[2]
A legislação brasileira regula o exercício da mediação extrajudicial e judicial demonstrando diferenças na qualificação do mediador que atua no âmbito extrajudicial e judicial. Assim, a lei 13.140/15 prevê que a prática da mediação extrajudicial poderá ser realizada por qualquer pessoa que seja capaz, capacitada e que partes tenham confiança.[3]
A lei 13.140/15 estabelece outro tratamento ao mediador judicial visto que determina que a pessoa para ser mediador judicial deverá ser graduada em curso superior no mínimo 2 (dois) anos, que seja capaz e tenha obtido a capacitação em instituição de formação de mediadores, reconhecida pela ENFAM – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de magistrados ou Tribunais, desde que seja observados os requisitos pelo CNJ.[4]
Observa-se que na prática há muitos mediadores capacitados em cursos de mediação, mas, não tem seus cadastros no CNJ, porque não atenderam a todos os requisitos exigidos pela lei como, por exemplo, o espaço de tempo de 2 (dois) anos de formado em nível superior.
No entanto, os mediadores extrajudiciais não são impedidos de exercerem a mediação extrajudicial, pois, se atendido os requisitos da lei da mediação, quais sejam, capacidade civil, capacitação e confiança das partes, podem livremente atuarem como mediadores no âmbito extrajudicial.
Embora a lei 13.140/15 atribua diferenças para o profissional funcionar como mediador extrajudicial e judicial, o procedimento da mediação deve ser seguido de forma igual na medida de suas desigualdades, ou seja, as etapas da mediação devem ser observadas, mas, deve ser guardado as diferenças em alguns pontos do procedimento, como no caso da mediação extrajudicial ser encaminhado um convite[5] enquanto na mediação judicial a lei processual determina que a partir da petição inicial as partes demonstrem o interesse de participar ou não da audiência de conciliação e mediação[6].
A própria lei da mediação estabelece na seção III o procedimento comum para mediação extrajudicial e judicial como também divide as especificidades nos dois procedimentos na subseção I e II.
No final do procedimento da mediação, a lei estabelece que deve ser lavrado um termo de acordo ou não acordo[7]. O acordo é um contrato que é um encontro de vontade das partes. Fábio Ulhoa citando Medeiros define que “o contrato é o resultado do encontro das vontades dos contratantes e produz seus efeitos jurídicos (cria, modifica ou extingue direitos ou obrigações) em função dessa convergência”.[8]
Na doutrina dos métodos adequados de soluções de conflitos, Carlos Eduardo de Vasconcelos também explica o significado do acordo na mediação, senão vejamos:
O acordo é um contrato, sendo necessária a qualificação das partes, a identificação do seu objeto, a definição das respectivas obrigações, as diretrizes a respeito de onde, como, quando deverão ser cumpridas essas obrigações e as consequências do não cumprimento, bem assim do não cumprimento bem assim o foro ou o modo como será exigido o seu cumprimento, e as assinaturas de duas testemunhas ou advogados.[9]
Dessa maneira, o termo de acordo da mediação é um contrato que produzirá efeitos entre todos os envolvidos. A lei 13.140/2015, no parágrafo único do art. 20 prevê que o termo de acordo tem eficácia de título executivo extrajudicial ou judicial, se homologado judicialmente.[10]
O Código de Processo Civil de 2015 prevê que o termo de acordo extrajudicial é título executivo extrajudicial, mas, desde que seja realizado por mediador credenciado por Tribunal. Vejamos:
Art. 784.  São títulos executivos extrajudiciais:
(…)
IV – o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública, pela Advocacia Pública, pelos advogados dos transatores ou por conciliador ou mediador credenciado por tribunal; (grifo nosso)
A questão a ser debatida é: Se a lei 13.140/2015 prevê no procedimento comum da mediação judicial e extrajudicial que o acordo é título executivo extrajudicial, mesmo sendo realizado por mediador extrajudicial que não precisa preencher os mesmos requisitos do mediador judicial; como fica a aplicabilidade do art. 784, IV, do CPC que considerado título executivo extrajudicial o acordo realizado por mediador credenciado por tribunal?
O questionamento seria facilmente resolvido se restringisse o entendimento da lei processual que somente o acordo extrajudicial do mediador judicial que teria eficácia de título executivo extrajudicial. Mas, a Lei de Mediação confere tratamento uniforme aos acordos conduzidos pelos mediadores extrajudiciais e judiciais.
A saudosa Ada Pellegrini Grinover entendeu que no Brasil temos três marcos regulatórios que assentam os métodos adequados de soluções de conflitos, quais sejam: Resolução 125/2010 do CNJ, os novos dispositivos do CPC/15 e a lei 13.140/15.
Nesse sentido, a autora compreendeu que as normas dos marcos regulatórios são compatíveis e complementares. Entretanto, há algumas regras do CPC que são incompatíveis com a Lei de Mediação, de modo que se entrarem em conflito, “as desta última deverão prevalecer”, porque se trata de lei posterior e de lei especial.[11]
Assim, seguindo o raciocínio da autora, a incompatibilidade entre o art. 784, IV do CPC e o parágrafo único do art. 20 da Lei 13.140/15, no que tange o acordo extrajudicial conduzido por mediador extrajudicial, que não tem seu cadastro no Tribunal, deve prevalecer aplicabilidade da Lei posterior e especial, isto é, deve prevalecer a Lei de Mediação, pois, confere ao termo do acordo conduzido por mediador extrajudicial a eficácia de título executivo extrajudicial.
Contudo, os estudos sobre antinomias das normas do CPC e da Lei de Mediação ainda está sendo objeto de pesquisa doutrinária, uma vez que tais legislações ainda são recém experimentadas pelos operadores do direito.
Notas e Referências
[1] Moore, Christopher W. O processo de mediação: estratégias práticas para a resolução de conflitos / Christopher W. Moore; trad. Magda Lopes. Porto Alegre: Artmed, 2 Ed. 1998, p.28.
[2] Didier Jr., Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento I -17. ed. – Salvador: Ed. Jus Podivm, 2015. v. I p. 276.
[3] Lei 13.140/2016- Art. 9º Poderá funcionar como mediador extrajudicial qualquer pessoa capaz que tenha a confiança das partes e seja capacitada para fazer mediação, independentemente de integrar qualquer tipo de conselho, entidade de classe ou associação, ou nele inscrever-se.
[4] Lei 13.140/2016- Art. 11. Poderá atuar como mediador judicial a pessoa capaz, graduada há pelo menos dois anos em curso de ensino superior de instituição reconhecida pelo Ministério da Educação e que tenha obtido capacitação em escola ou instituição de formação de mediadores, reconhecida pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – ENFAM ou pelos tribunais, observados os requisitos mínimos estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça em conjunto com o Ministério da Justiça.
[5] Art. 21. O convite para iniciar o procedimento de mediação extrajudicial poderá ser feito por qualquer meio de comunicação e deverá estipular o escopo proposto para a negociação, a data e o local da primeira reunião.
[6] CPC, Art. 334.  Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.
[7]  Lei 13.140/2015 Art. 20. O procedimento de mediação será encerrado com a lavratura do seu termo final, quando for celebrado acordo ou quando não se justificarem novos esforços para a obtenção de consenso, seja por declaração do mediador nesse sentido ou por manifestação de qualquer das partes.
[8] ULHOA, Fabio, 2011 p.75
[9] VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de Conflitos e Práticas Restaurativas. São Paulo. Ed. Método. 2008. p. 96
[10] Art. 20 (…) Parágrafo único. O termo final de mediação, na hipótese de celebração de acordo, constitui título executivo extrajudicial e, quando homologado judicialmente, título executivo judicial.
[11] GRINOVER, Ada Pellegrini. Os métodos consensuais de soluções de conflitos no NCPC. Em o Novo Código de Processo Civil: questões controvertidas. São Paulo, Atlas, 2015. p. 2-3.
Por Benigna Teixeira, Mestre em Direitos Humanos, Coordenadora e Professora da Pós Graduação em Métodos Adequados em Soluções de Conflitos no Centro Universitário Icesp. Professora de graduação e cursos jurídicos em processo civil. Advogada e Mediadora Judicial e Extrajudicial.
Fonte: Empório do Direito – 05/08/2019
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